Câmara de Serviços da CNC debate reflexos da pandemia no setor

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30/06/2020

O impacto causado à economia e seus profundos reflexos no segmento de serviços em virtude da pandemia da covid-19 concentraram palestras e debates da reunião da Câmara Brasileira de Serviços (CBS) da Confederação  Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), realizada por videoconferência, em 24 de junho, com a participação de integrantes em todas as regiões do País.

O coordenador Edgar Segato Neto considerou um desafio para o empresariado enfrentar o momento crítico atual: “Não há registro na história recente da humanidade de situação semelhante a que estamos vivendo.”

Para Segato, que também é diretor da Federação Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços de Limpeza e Conservação (Febrac), muitos empreendimentos sofrerão modificação, outros deixarão de existir, e será preciso se adaptar ao que está sendo chamado de ‘novo normal’, “que de novo tem tudo, mas de normal está difícil de aceitar”.

A seu ver, é muito relevante que o debate esteja aberto, democraticamente colocado para todas as opiniões, tendências e linhas do pensamento jurídico. “É o que a CBS vai defender”.

Momento delicado

O coordenador das Câmaras de Comércio da CNC, Luiz Carlos Bohn, destacou a importância de reuniões de trabalho para discutir a realidade dos segmentos econômicos representados pela Confederação, “ainda mais num momento tão delicado na vida das empresas, diante dos reflexos da crise gerada pelo novo coronavírus”.

Segundo ele, as implicações no cotidiano corporativo foram muito severas e as palestras de especialistas das áreas técnicas da entidade foram úteis para esclarecer as muitas dúvidas do empresariado, especialmente em relação a novas legislações que entraram em vigor. O dirigente se referia à grande quantidade de medidas provisórias editadas pelo governo federal, os projetos de lei apresentados na Câmara dos Deputados e Senado e as decisões de governos estaduais e municipais para amenizar os efeitos da pandemia no cotidiano empresarial.

Bohn, que também é 2º vice-presidente da CNC e presidente da Fecomércio do Rio Grande do Sul, declarou que a reunião da CBS foi muito proveitosa em termos de conteúdo, “permitindo levar material consistente sobre a real situação do setor de Serviços para avaliação da Diretoria da Confederação”.

Jurídico

A pauta da reunião, que durou quase quatro horas, foi extensa. Técnicos e especialistas de divisões da CNC fizeram palestras nas áreas jurídica, econômica, sindical e de relações institucionais. O advogado Marcus Lima, da Divisão Jurídica, falou sobre diversos projetos e medidas provisórias que afetam o setor.

Sobre a Medida Provisória nº 959/2020,que adia para maio de 2021 o início da vigência dos principais pontos da Lei Geral de Proteção De Dados (LGPD), informou que seu texto não foi aceito plenamente pelo Congresso. Sua sugestão foi de que, apesar de as sanções de não cumprimento da legislação só possam ser aplicadas a partir de 1º/08/2021, conforme previsto na Lei nº 14.010, de 10 de junho de 2020, o ideal é que as empresas cumpram as exigências da LGPD desde já.

Falou também sobre o Projeto de Lei nº 1.179/2020, que dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado no período da pandemia. Ao sancionar a lei, o presidente da República vetou as disposições que tratavam ‘Das Locações de Imóveis Urbanos’.

Ele lembrou que as locações de imóveis são relações eminentemente contratuais e, assim, dependem do ajuste de vontade das partes. Por isso, durante a pandemia, a melhor solução a impasses ocorridos no cumprimento dos contratos locatícios é o acordo entre as partes.

Em relação aos reflexos durante a crise nos contratos de seguro, o advogado da DJ citou os Projetos de Lei nº 1.885/2020 (veda a suspensão ou rescisão unilateral dos contratos dos planos privados de assistência à saúde) e nº 2.113/2020 (determina que o seguro de assistência médica ou hospitalar, bem como o seguro de vida ou de invalidez permanente não poderá conter restrição de cobertura a qualquer doença ou lesão decorrente da emergência de saúde pública de que trata a Lei).

Ambos, segundo ele, violam o princípio constitucional da liberdade de iniciativa, à medida em que subtraem do empreendedor a autonomia para decidir a forma como conduzir seu negócio (atividade econômica). “Caso sejam convertidos em lei, vão onerar de forma demasiada as empresas seguradoras, que podem ter que arcar com indenizações sobre riscos não cobertos pela apólice.”

Ele falou ainda sobre a portaria do Ministério da Economia, prorrogando o prazo para recolhimento das contribuições previdenciárias patronais e o Projeto de Lei nº 985/2020, dispondo sobre medidas excepcionais relativas ao prazo de apresentação das obrigações acessórias contábeis e fiscais, bem como, procedimentos relativos a cobrança de multas e juros por atraso de pagamento das obrigações fiscais e financeiras, das empresas.

A seu ver, tais medidas não são suficientes para enfrentar a crise. Em razão disso, recomendou, como medida mais adequada e eficiente, que a empresa que estiver diante de dificuldade financeira decorrente da pandemia busque provimento jurisdicional no sentido de obter a suspensão temporária da exigibilidade de tais tributos.

Finalmente, citou a Medida Provisória nº 975, a qual institui o Programa Emergencial de Acesso a Crédito, beneficiando pequenas e médias empresas, para que elas se financiem enquanto durarem as restrições impostas ao funcionamento regular de suas atividades e, inclusive, para a recuperação da atividade econômica. A iniciativa se soma ao Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe – focado nas microempresas).

Para Edgar Segato, esses pontos são relevantes. “É preciso iluminar o debate em torno de transformações, mudanças, arranjos e rearranjos que faremos na vida de nossas empresas e em nossos contratos a partir do final da pandemia, ou, ao menos, do fim do estado de isolamento social que estamos vivendo.”

Economia

O economista Antonio Everton Chaves Junior, da Divisão Econômica da CNC, analisou a crise gerada pelo novo coronavírus e as políticas públicas que vêm sendo implementadas pelo governo.

Segundo ele, a concessão de crédito para as empresas e famílias vem crescendo, atingindo R$ 3,44 trilhões no mês passado, algo próximo de 50% do PIB. Os empréstimos têm crescido, com destaque para o mês de abril e as primeiras semanas de maio, “período em que pode se considerar que a economia atingiu o fundo do poço”.

Ao falar sobre a importância dos serviços, Junior revelou que o setor tem peso muito  relevante na economia brasileira, da ordem de 62%.

Ele falou ainda sobre a liberação dos recursos bancários por meio do Programa Emergencial de Suporte ao Emprego (PESE). “Se em abril somente 4% haviam sido liberados, em junho já são quase R$ 10 bilhões, cerca de 10% dos R$ 40 bilhões disponibilizados para o pagamento da folha salarial.

Outra linha que vem atender aos anseios dos empreendedores individuais, micro e pequenos negócios é o Programa Nacional de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Pronampe), cujo crédito pode ser usado para investimentos e capital de giro isolado ou associado ao investimento. “Ambas linhas de crédito foram criadas a taxas de juros baixíssimas e, portanto, são atraentes. O governo também concedeu garantias.”

Antonio Everton Junior disse aos participantes da reunião que o momento é de as empresas se reinventarem, principalmente através do uso das ferramentas tecnológicas na internet e pela digitalização de processos, produtos e serviços, uso de drones, robôs, entre outras ferramentas. “O consumidor presencial praticamente virou virtual para muitos negócios. Portanto, fazer investimentos em tecnologia e adequar a estrutura de custos à das receitas será fundamental. Até porque a retomada do crescimento será lenta.”

Sindical

A advogada Luciana Diniz Rodrigues, Divisão Sindical da CNC, detalhou a decisão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 9ª Região, que reconheceu a possibilidade de cláusula da Convenção Coletiva de Trabalho (CCT), a qual prevê piso salarial diferenciado para vigilância, conforme o destinatário do serviço.

Segundo ela, o Ministério Público do Trabalho propôs Ação Civil Pública, questionando cláusula da CCT que estabelece piso diferenciado para vigilantes de carro forte. Em primeira instância, a ação foi julgada procedente.

A decisão, no entanto, foi reformada em acórdão de Recurso Ordinário, considerando que há outras profissões que, apesar de estarem na mesma categoria, têm piso diferenciado, como é o caso de motoristas de carreta de rodovia e de carro leve. Assim, foi considerada válida a cláusula da Convenção.

Luciana falou ainda a respeito da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre doença ocupacional e a covid-19. Ela informou que, em liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 6.342, o STF suspendeu os efeitos do artigo 29 da MP nº 927/2020.

“Desse modo, é aplicável a lei vigente (nº 8.213/1991) sobre o tema. Com isso, é necessária a comprovação do nexo causal para determinar se é doença ocupacional”, informou a advogada, esclarecendo ainda que a CNC ingressou como amicus curiae (pessoa ou entidade estranha à causa, que vem auxiliar o tribunal, oferecendo esclarecimentos sobre questões essenciais ao processo) na ADI.

Com relação à prorrogação dos efeitos das Medidas Provisórias nº 927 e nº 936, ambas de 2020, esclareceu que a ampliação é apenas relacionada aos efeitos, mas não alterou os prazos de 60 dias para suspensão e 90 dias para redução de jornada e salários.

Relações Institucionais

Na última etapa da reunião, o especialista executivo Reiner Leite, da Divisão de Relações Institucionais (DRI) da CNC falou sobre proposições de interesse do setor em tramitação no Congresso. Entre elas, a MP nº 936/2020 e a MP nº 927/2020.

Segundo ele, na primeira foi mantido o texto aprovado na Câmara dos Deputados que prorroga os efeitos da medida até o final da pandemia.

Dos dispositivos contidos na MP, ele destacou o pagamento do benefício emergencial pela União, a redução proporcional da jornada de trabalho e de salário e a suspensão temporária do contrato de trabalho (60 dias, podendo fracionar em dois períodos de 30 dias).

Já a MP nº 927/2020, que trata da flexibilização trabalhista, estabelece, dentre outros pontos, a celebração de acordos individuais, a opção de home office, o gozo de férias – ainda que o período aquisitivo não tenha transcorrido –, a antecipação de feriados e a compensação de banco de horas.

Em outro tema abordado, Leite anunciou que a DRI vai resgatar tratativas no Ministério da Justiça sobre o Decreto nº 9.450/2018, que institui a Política Nacional de Trabalho no âmbito do sistema prisional, voltada à ampliação e qualificação da oferta de trabalho e a formação profissional das pessoas egressas do sistema prisional. O decreto trata ainda de questões pertinentes às licitações de contratos da administração pública firmados pelo Poder Executivo.

Finalmente, ele falou sobre a votação do Substitutivo da Câmara nº 6 de 2016 ao Projeto de Lei do Senado nº 135/2010 do Estatuto da Segurança Privada. A CNC, segundo ele, é favorável à proposição, mas com ressalva. “O substitutivo cria um regramento oportuno e razoável às empresas de segurança privada, trazendo segurança jurídica à sociedade civil e empresarial, para que possa cumprir a sua função social”, explicou.

A ressalva é quanto à supressão do artigo 29, § 5º, que constava do texto aprovado na Câmara dos Deputados, em que o cumprimento da cota era vinculado ao quadro administrativo da empresa e não de todo o contingente efetivo da organização.

Medidas emergenciais

Último palestrante da reunião da CBS, o presidente da Federação Nacional das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas (Fenacon), Sérgio Approbato Machado Júnior, falou sobre as ações da entidade em relação às medidas emergenciais tomadas em função da pandemia do novo coronavírus. “Monitoramos o Legislativo e o Executivo, porque havia tantos projetos de lei quanto medidas provisórias sendo divulgados pelo governo federal e avaliados no Congresso Nacional”, disse.

A Fenacon também orientou seus filiados sobre as medidas aprovadas, especialmente aquelas que visavam evitar o desemprego, as MPs nº 927 e nº 936, em particular.

Approbato comentou também o que chamou de “ação forte” junto à Receita Federal, por meio de ofício, no mês de março, solicitando a postergação de todas as obrigações tributárias das empresas, principais e acessórias. Em abril, ele esteve com o secretário José de Assis Ferraz Neto para tratar deste e de outros temas.

“Não foi só cobrança. Levamos a ele uma palavra de otimismo, falando como as empresas estão se modernização, investindo em inovação e tecnologia, certificação digital, criptografia da informação, isto é, as tendências do mercado num mundo digitalizado. E citei exemplos de novos procedimentos que vêm sendo adotados por muitos de nossos clientes.”

Essas iniciativas, de acordo com o presidente da Fenacon, se incorporam a uma nova estrutura de operação das empresas, “dentro desse novo mundo que virá, com benefícios evidentes para que se faça, por exemplo, o controle de trabalho a distância, em função do crescimento natural, após a pandemia, do serviço em home office.”

O dirigente falou com ênfase também da questão dos impostos, preocupação que, segundo ele, já existia antes da pandemia, se referindo aos projetos de lei que tratam da tributação de lucros e dividendos. As proposições eram consideradas ruins, levando Approbato a audiências com os senadores que estavam com a relatoria, Jorge Kajuru (Cidadania-GO) e Jean-Paul Terra Prates (PT-RN). Kajuru inclusive apresentou novo parecer ao projeto PLS nº 2.015/2019, que também reduz progressivamente o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica.

Ele comentou ainda os vários projetos de lei em tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado que tratam da cobrança sobre grandes fortunas. “É uma injustiça. Qual é a base de sustentação desses projetos? É a variação patrimonial que têm as pessoas. Essa variação, em boa parte dos casos, não é gerada pela pessoa, mas fruto de herança. Há situações em que, quem recebe, muitas das vezes nem dinheiro para pagar o imposto tem. É muito injusto tributar com esse conceito.”

Por fim, ele comentou a intenção no Congresso de passar rapidamente o projeto de reforma tributária, especialmente a Proposta de Emenda à Constituição nº 45/2019, cujo ponto central é a substituição de cinco tributos por um único imposto, que seria chamado de imposto sobre bens e serviços (IBS).

“Na verdade, é uma PEC que só aumenta a carga tributária, pois só mexe com a tributação sobre consumo. E ainda estamos aguardando a proposta do governo federal, que se espera seja bem mais ampla e toque na questão da renda. Temos que ficar atentos a todas essas mudanças porque tem implicações na vida das empresas”, encerrou.

Reunião

Num balanço da reunião, o coordenador Edgar Segato afirmou que, “diante de muitas dúvidas em relação às legislações voltadas para as empresas publicadas ultimamente, a CBS teve uma pauta integrada com assuntos jurídicos, econômicos, sindicais e legislativos. O corpo técnico da CNC passou informações e esclareceu dúvidas, ajudando os empresários a interpretar e aplicar em seus negócios”. Para o dirigente, a reunião teve êxito, constatado a partir do retorno dos participantes, tanto em falas como em mensagens. “Temos um trabalho árduo pela frente, não será fácil, mas não recuaremos, não podemos esmorecer. Seguimos em frente porque somos um setor importante da sociedade, geramos muitos empregos, recolhemos muitos impostos e acreditamos no Brasil que está dando certo. Vamos construir, junto com a atual gestão da CNC, um mercado mais promissor para nossas empresas, para a sociedade como um todo”, concluiu.

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