Senado suprime mudanças feitas pela Câmara na MP que reduz salários e jornadas durante a pandemia

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A supressão de mudanças feitas pela Câmara foi a principal discussão durante a votação da MP que altera a legislação trabalhista para evitar demissões durante a pandemia de covid-19 (MP 936/2020). A retirada de itens estranhos ao objetivo inicial da medida, os chamados “jabutis”, foi a solução encontrada para não fazer alterações de mérito no texto, que teria que voltar à Câmara. O projeto decorrente da medida (PLV 15/2020) seguiu para a sanção presidencial.

A impugnação de artigos estranhos ao objetivo inicial de medidas provisórias é adotada desde 2015, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que proibiu a aprovação de medidas com temas que não tenham relação com o mérito. A retirada de um dos artigos do projeto foi aprovada apesar dos apelos do líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).

O texto aumentava a carga horária dos bancários, atualmente limitada a 30 horas semanais. Também excluía do cálculo de salários os tíquetes-alimentação, isentando as empresas do pagamento de tributos sobre essa parcela. Apesar de concordar com a retirada desses pontos, o governo queria manter a redução dos juros que as empresas pagam sobre dívidas e a permissão para que depósitos judiciais fossem substituídos por fiança bancária ou seguro garantia judicial.

— Nós estamos no meio de uma pandemia, as empresas estão quebrando, os processos trabalhistas vão explodir, e nós vamos abrir o caminho para fechar as empresas. Isso não é descuidar dos direitos dos trabalhadores; isso é salvar as empresas brasileiras — argumentou Bezerra.

O líder do PT, senador Rogério Carvalho (SE) discordou. Para ele, a medida tinha relação com o momento da pandemia da covid-19 e as alterações que o governo queria aprovar seriam permanentes. O senador afirmou que não aceitaria as mudanças, que prejudicariam trabalhadores.

— Trata-se de uma medida provisória sobre a covid-19. Nós estamos falando de alterações na CLT, para sempre, numa medida provisória, matéria que já foi objeto de outra medida provisória. É uma matéria que claramente deve ser impugnada — argumentou o senador, em referência à MP 905/2019, que foi revogada porque perderia o prazo para a votação.

Vulnerabilidade

Na mesma linha, os líderes da minoria, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), e do Podemos, senador Alvaro Dias (PR), lembraram que o momento é de vulnerabilidade dos trabalhadores, parte mais frágil da relação entre capital e trabalho.

— Nós estamos votando uma medida provisória que trata de relações trabalhistas supostamente em benefício dos trabalhadores, que, na relação capital/trabalho, são a parte mais vulnerável. Não podemos de forma alguma, aceitar um corpo estranho à matéria que venha contrariar interesses dos trabalhadores — disse o líder do Podemos.

O senador Jaques Wagner (PT-BA) afirmou que os trabalhadores já estão tendo que aceitar a redução de salários e a suspensão de contratos e que não é possível aproveitar o texto para passar mudanças definitivas que os prejudicariam.

— Nesse caso, é para mudar definitivamente, então, o governo, os empresários ou aqueles que querem, apresentem um texto de mudança da CLT como já foi apresentado na MP 905/2019 — disse o senador.

A líder do Cidadania, senadora Eliziane Gama (MA), disse que não é possível aceitar o uso do período de pandemia para retroceder e retirar direitos conquistados ao longo de tantos anos pelos trabalhadores. Alterações nas leis trabalhistas, no entendimento da senadora, devem ser amplamente discutidas e feitas por projetos de lei, não por medida provisória.

— Nós não podemos usar as votações remotas para tirar direitos do trabalhador brasileiro, mas para mitigar e reduzir os efeitos perversos da pandemia. E a sociedade brasileira não pode enxergar o Congresso Nacional como algo que se aproveita de uma crise sanitária para a retirada desses direitos.

Empregos

Os líderes do DEM, senador Rodrigo Pacheco (MG), e do Progressistas, senador Ciro Nogueira (PI), defenderam a manutenção dos pontos defendidos pelo governo. Para Rodrigo Pacheco, a manutenção do texto apenas com ajuste de redação, como indicava o relatório do senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO),  não iria contra a essência da medida.

— Não vamos perder de vista que o principal mesmo é a essência dela, em relação à preservação de empregos. O Democratas encaminhará o voto “não” à impugnação, mantendo, nesse item, incólume o relatório do senador Vanderlan, que vai ao encontro daquilo que decidiu também a Câmara dos Deputados. Não se trata de matéria estranha, e sim pertinente ao teor da medida provisória.

O líder do PSL, Major Olimpio (SP), afirmou que “o ótimo é inimigo do bom”. Para ele, na situação atual, seria hipocrisia votar pela retirada do artigo em discussão, já que empresas em dificuldades não terão como arcar com o que prevê a Consolidação das Leis do trabalho (CLT).

— O fato é que as empresas estão todas quebradas, estão todas arrebentadas. Se pegarmos as escolas particulares, como disse o Vanderlan, que têm 15 milhões de alunos e 800 mil professores, estão todas arrebentadas. Não vão conseguir pagar, nos próximos anos, o que está aí previsto na atual CLT, assim como o pessoal do transporte de cargas, assim como o das telecomunicações, assim como o da segurança e serviços e tantas outras áreas — argumentou.

Como não houve acordo entre os líderes, retirada do artigo foi aprovada após votação nominal.

Consignados

O outro artigo, retirado do texto após votação simbólica, tratava do aumento na margem dos empréstimos consignados em folha de pagamento dos servidores públicos de 35% para 40%.  Principal crítico da mudança, o líder do PDT, senador Weverton (MA) disse ter recebido mensagens de pressão por parte de empresas e associações que lucrariam com o aumento da margem. Essas mensagens, segundo o senador, só aumentaram sua convicção de estar do “lado certo”.

— Só no ano passado, 2019, foram R$ 138 bilhões de operações de crédito consignado. Nós estamos falando de 35 milhões de beneficiários, dos quais 23 milhões recebem apenas um salário mínimo, segundo dados do INSS. Para eles, o salário ia ficar na média de R$ 600. Não teriam mais condições de ter esse dinheiro ao longo de quase sete anos, que é a média para um aposentado ou para um funcionário público quitar a sua dívida — disse o senador.

O relator, senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), disse concordar com Weverton e ser contra o aumento da margem. A manutenção desse ponto no texto, segundo o relator, se deu após pedido de entidades que representam os trabalhadores.

— Eu tive uma reunião com as centrais sindicais que representam os trabalhadores e perguntei se eles estavam de acordo com o aumento de 35% para 40% e qual era a justificativa para que isso acontecesse em tempo de pandemia. E a resposta deles foi que, neste período de pandemia, um dos poucos recursos que existem para se buscar com juros mais baratos seria o dos consignados — explicou.

O líder do MDB, senador Eduardo Braga (MDB-AM) afirmou que estender esses limites por medida provisória quando o sistema financeiro e os bancos cobram seis vezes, a mais do que a taxa Selic é, intolerável.

— Quando chega no final do mês, o que vai acontecer é que o trabalhador vai receber só o contra, porque o cheque já ficou na mão dos bancos — alertou.

Projeto

Os senadores defenderam a votação de projeto do senador Otto Alencar (PSD-BA) que suspende os pagamentos das obrigações de operações de créditos consignados em benefícios previdenciários enquanto durar a calamidade do coronavírus (PL 1.328/2020). A suspensão atinge quatro parcelas do contrato, sem fixar um prazo. Ainda pelo projeto, a falta de pagamento não será considerada inadimplemento de obrigações, nem serão cobrados multas, taxas, juros ou outros encargos.

Fonte: Agência Senado

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